Fragmento de uma verdade
VI
O mundo. A terra. A vida.
No princípio, sem forma e vazia, mas através de uma palavra,
de um único ato, tudo que se vê veio a existir.
O mundo. A terra. A morte.
E no fim, toda a forma perfeita e bela se acabará através do mesmo ato,
usando a mesma arma gramatical.
Nos lábios que proferem vida há também a morte. O paradoxo.
Vida e morte habitando no mesmo espaço, no mesmo corpo, na mesma mente.
Irmãs, nascidas em tempos diferentes, desejada e indesejada caminham juntas, ~
mesmo que não se perceba, mesmo que não se queira ver.
Para que haja vida é preciso que exista a morte.
A semente só existe porque em algum momento ela fora fruto.
O fruto só existe porque um dia submeteu-se a posição de semente e
pacientemente aprendeu a desenvolver.
O ciclo. A vida.
Assim, como os seres vivem e morrem as palavras também se vão, se fecham, morrem.
Palavras são como sementes lançadas em todo tipo de campo.
Algumas se permite nascer, outras tentam viver, algumas morrem.
O ciclo natural da vida semiótica.
Eis o final de nossas palavras.
A tentativa de uma construção mais que semântica revelou ao final
que palavras são signos mágicos e como alquimistas tentamos fazê-las gerar
mais do que poderiam para esse tempo e elas, obedientes, seguiram por um certo tempo
nosso feitiço mas, poderosas se desprenderam rapidamente do emaranhado confuso
que estávamos a fazer e preferiram voar para outras matas, para outros desertos.
Com a sabedoria de quem esteve presente na criação de tudo, as palavras assim se ausentam
nesse instante. Partem apenas para nos dar a chance
de viver um instante a mais de nossas vidas distantes e distintas.
Patrícia Prado